Representantes de comunidades de Fundo e Fecho de Pasto no dia 15 de junho, terceira vez em que a ADI 5783 entrou na pauta. Foto: Letícia Verdi/ISPN

Representantes de comunidades de Fundo e Fecho de Pasto no dia 15 de junho, terceira vez em que a ADI 5783 entrou na pauta. Foto: Letícia Verdi/ISPN

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STF deve julgar marco temporal que viola direitos de comunidades tradicionais de Fundo e Fecho de Pasto

Ação Direta de Inconstitucionalidade está na pauta do Supremo Tribunal Federal e tem a ministra Rosa Weber como relatora

 

Atualização – A ADI está no primeiro item da pauta no dia 6 de setembro.

Um outro marco temporal está em pauta no Supremo Tribunal Federal (STF), além do indígena. É a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n° 5783, que contesta o marco temporal para os territórios de comunidades de Fundo e Fecho de Pasto, estabelecido por lei da Bahia. A ação, que ameaça a vida de cerca de 1,5 mil comunidades, entrou na pauta desta quinta-feira (29/06), pela quarta vez. A expectativa é que agora seja votada, pois subiu para o segundo lugar na ordem da pauta.

As comunidades de Fundo e Fecho de Pasto têm um modo de vida tradicional marcado pelo uso coletivo da terra para a criação de cabras e ovelhas, sobretudo na Caatinga, ou gado solto com pastagem nativa, coleta de frutas e plantas medicinais, plantio de hortas e roças para subsistência. Saiba mais na publicação Comunidades tradicionais de Fecho de Pasto e seu modo próprio de convivência com o Cerrado: história, direitos e desafios.

“Nós lutamos e resistimos para existir”, diz a liderança Jamilton Santos Magalhães, conhecido como Carreirinha, da Associação de Fundo e Fecho de Pasto de Capão Grosso (BA). A comunidade de Carreirinha recebe apoio do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) para aprimorar o manejo do território coletivo, por meio do Fundo de Promoção de Paisagens Produtivas Ecossociais, o PPP-ECOS.

Referência jurídica

O prazo (marco temporal) para o reconhecimento dos territórios foi estipulado no artigo 3º, parágrafo 2º da Lei n.º 12.910, de 11 de outubro de 2013, instituída pelo estado da Bahia. A lei limita a 31 de dezembro de 2018 a emissão de certidão de autorreconhecimento e regulação dos territórios tradicionais – ameaçando, assim, as populações e os biomas Cerrado e Caatinga.

Mais de 200 organizações da sociedade civil e entidades de classe assinaram uma carta na qual pedem que o STF rejeite o marco temporal. Leia a íntegra da carta aqui. “Caso essa ADI não seja acatada, o impacto negativo será incalculável para o direito de povos e comunidades tradicionais em geral, não apenas para as comunidades de Fundo e Fecho de pasto”, destaca a coordenadora do Programa Cerrado e Caatinga do ISPN, Isabel Figueiredo.

“A decisão do STF terá efeito de grande relevância, pois se tornará referência jurídica para outras ações semelhantes no futuro”, explica a advogada Edlange Andrade do Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), amicus curie no processo.

O direito à autoidentificação, à terra e ao território está previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e na Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (Decreto 6.040/2007), além da Constituição Federal de 1988.

Desmatamento no Cerrado e Caatinga: comunidades ameaçadas

Segundo dados do relatório anual do Mapbiomas (RAD2022), o estado da Bahia está no topo do ranking do desmatamento no Brasil. Foram 33 mil hectares desmatados entre 2020 e 2022, nos biomas Cerrado e Caatinga. Um dos estados da maior fronteira agrícola em expansão no Brasil – o Matopiba, a Bahia vem sendo invadida por grileiros de terras e agronegócio de commodities, com o aval informal do governo estadual.

Mais de duas décadas sem novas titulações na Bahia

Um levantamento da Campanha Cerrado aponta que, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, apenas 130 comunidades tiveram títulos emitidos pelo estado da Bahia. Neste momento, 192 comunidades estão com seus processos de certificação paralisados.

Organizações da sociedade civil apontam o agravamento dos conflitos fundiários e socioambientais nos territórios tradicionalmente ocupados por comunidades de Fundo e Fecho de Pasto da região oeste da Bahia.

Valdivino Rodrigues, integrante da Articulação Estadual de Fundo e Fecho de Pasto, denuncia: “A violência vem aumentando por conta do avanço da grilagem de terras, do agronegócio, da mineração e dos empreendimentos de geração de energia tidas como limpas, porém com métodos absolutamente sujos.”

As comunidades de Fundo e Fecho de pasto integram o Conselho Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT), ao lado de quilombolas, indígenas, seringueiros, ciganos e quebradeiras de coco, entre
outros.

Clique aqui para saber a diferença entre fundo e fecho de pasto, em matéria do site Tô no Mapa – plataforma de autoidentificação dos territórios de povos e comunidades tradicionais.

 

Texto e foto: Letícia Verdi / Ascom ISPN

Na foto, representantes de comunidades de Fundo e Fecho de Pasto no dia 15 de junho, terceira vez em que a ADI 5783 entrou na pauta do Supremo e não foi votada. 

 

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