Coapima e Amima elegem nova coordenação durante assembleia histórica
Indígenas do Maranhão elegem nova coordenação para suas principais organizações e reafirmam a luta pelos direitos territoriais e acesso às políticas públicas
Cercada por imponentes chapadas, a aldeia São José, na Terra Indígena Krikati, localizada no sudoeste do Maranhão, foi palco de dois eventos estratégicos para os povos indígenas desse estado, realizados em conjunto, entre os dias 12 a 17 de março de 2023. Trata-se do 5º Encontro da Articulação das Mulheres Indígenas do Maranhão (Amima) e da 6ª Assembleia Ordinária da Coordenação das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Maranhão (Coapima), que, além de renovar as suas coordenações, também discutiram cenários e desafios para garantir a proteção dos territórios ancestrais e acesso às políticas públicas que respeitem a diversidade indígena.
Participaram mais de 400 pessoas representantes dos 14 povos indígenas do estado, bem como parceiros e aliados. Anciões, anciãs e a juventude indígena também tiveram ampla participação nas discussões. Os eventos contaram com o apoio do projeto Gestão Ambiental e Territorial Integrada de Terras Indígenas na Amazônia Oriental, que é uma parceria do Instituto Sociedade, População e Natureza-ISPN, com o Centro de Trabalho Indigenista – CTI, Coapima, Amima, Wyty Catë e apoio da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento –Usaid. O projeto Paisagens Indígenas, parceria ISPN, CTI e Nupef, com aporte financeiro da Iniciativa Internacional de Clima e Floresta (Nicfi), também apoiou a realização do evento.
Participantes das assembleias da Coapima e Amima.
Anima: o protagonismo da mulher indígena maranhense
Com uma plateia lotada de mulheres indígenas, Taynara Guajajara, ex-coordenadora da Amima, definiu a instância como um braço da Coapima, na qual tudo é alinhado.
“A Amima também é Coapima, no entanto, organizamos as pautas das mulheres indígenas do estado e lutamos por elas, e assim garantimos o nosso protagonismo e autonomia”, explicou Taynara.
A instância adota uma gestão que contempla a paridade entre as três macrorregiões indígenas do Maranhão: o norte, o centro-oeste e o sul. Cada região é representada por uma coordenadora geral e suas articuladoras de base. O centro-oeste, no entanto, por contemplar os povos Guajajara (Tupi) e Timbira (Jê), conta com duas representações.
As coordenações se renovam a cada três anos. Passado o último triênio 2020-2023, é chegada a hora de uma nova eleição. Mas, antes do pleito, a Amima fez um balanço das principais conquistas e desafios enfrentados nos últimos anos. As coordenadoras que estavam encerrando o mandato, destacaram que o crescimento da Articulação fomentou projetos de sustentabilidade e a formação de mulheres indígenas enquanto lideranças. “Precisamos continuar investindo no protagonismo das nossas mulheres indígenas. E estamos num momento único da história desse país, que destaca a força do nosso movimento. Aqui somos uma fábrica de lideranças potentes”, destacou Edilena Krikati.
Após os dois dias intensos de muitos debates e regados a cantos indígenas Tenetehara e Timbira, aconteceu a eleição da nova coordenação. A composição ficou assim:
Região Norte: Amanda dos Santos Guajajara (titular) e Rosilene Ka´apor (vice) e mais 6 coordenadoras de base;
Região Sul: Diolina Krikati (titular) e Cintia Guajajara (vice) e mais 6 coordenadoras de base;
Região Centro-Oeste (Tupi): Monalena Guajajara (titular) e Janira Guajajara (vice) e mais 10 coordenadoras de base;
Região Centro-Oeste (Timbira): Maria José Kanela (titular) e Mariara Timbira (vice) e mais 4 coordenadoras de base.
Coapima: nova coordenação geral
Em clima de celebração, os últimos dois dias foram dedicados à 6a Assembleia Ordinária da Coapima, principal organização indígena do estado, que este ano comemora 20 anos de existência formalizada. Registrada em 13 de setembro de 2003, a organização articula e representa lideranças, comunidades e organizações dos povos indígenas do Maranhão.
Conforme o seu estatuto social, a instância atua na defesa dos direitos territoriais, socioculturais, ambientais, educacionais, de saúde, dentre outros, bem como na promoção da sustentabilidade econômica e ambiental dos territórios indígenas, seu bem viver e a governança autônoma.
Assim como a Amima, a Coapima também renova sua coordenação executiva a cada três anos. O último triênio em especial, foi apontado como um dos mais desafiadores, não só por terem enfrentado o contexto de um governo abertamente anti-indígena, que desmontou políticas e perseguiu direitos originários, como também pela pandemia da Covid 19, que trouxe muitos impactos e graves consequências aos territórios indígenas.
Apesar de todos os desafios, a organização conseguiu se fortalecer institucionalmente, realizando incidências políticas regionais e nacionais e acessando projetos por meio de parcerias com a sociedade civil organizada, governos e agências de cooperação internacional. Tudo isso também foi reiterado pelos aliados/as da Coapima e Amima que estiveram presentes na abertura da assembleia, dentre eles/elas Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Wyty-Catë do Povo Timbira, Centro de Trabalho Indigenista (CTI), Instituto Makarapy, Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Conselho Estadual dos Direitos Humanos, Sociedade Maranhense de Direitos Humanos, Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama), Onu Mulheres, Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Distrito Sanitário Especial Indígena – MA e o Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi). Todos/as enfatizaram especialmente a continuidade das ações que envolvem temáticas prioritárias como a gestão ambiental e territorial, demarcação de terras, segurança, saúde, educação e acesso a políticas públicas e outras iniciativas de desenvolvimento sustentável para o próximo triênio.
O coordenador do Programa Povos Indígenas do ISPN, João Guilherme Nunes Cruz, destacou na sua fala que a parceria do Instituto com a Coapima e Amima se fortalece em virtude do encontro das visões de mundo entre as instituições.
“Sonhamos parecido, acreditamos que a promoção do bem viver das comunidades, o fortalecimento da gestão territorial e a geração de renda podem acontecer com a Amazônia e o Cerrado em pé”, disse.
O coordenador João Guilherme parabenizou ainda a gestão da Coapima e Amima que estavam encerrando mandato, especialmente por conduzirem com bastante empenho as atividades dos projetos com os parceiros.
“Esse mandato que se encerra encarou muitos desafios, dentre eles a pandemia, enquanto o país estava despreparado para enfrentar essa situação. Pudemos acompanhar de perto o esforço da Copaima e da Amima em dar continuidade aos projetos, usando de muita habilidade e liderança para cumprir prazos e administrar as dificuldades”, completou.
Outra ocasião importante durante a assembleia foi a atualização do estatuto social da coordenação, importante para atender às atuais demandas da organização que começaram a aparecer com os anos de atuação da Coapima. Os presentes debateram e contribuíram com os pontos destacados trazidos pelos advogados Kari Guajajara e Aluísio Azanha, assessores jurídicos da Coapima. Um dos destaques foi a reestruturação da governança da Coapima, que agora incorpora um conselho fiscal mais enxuto, articuladores de base e um conselho consultivo formado por lideranças experientes do movimento indígena.
Representantes das instituições parceiras da Coapima e Amima: ISPN, CTI, Cimi, Funai, Sesai, Instituto Macarapy, Wyty-Cate, Onu Mulheres, Ibama e Coiab.
Um mandato conduzido por mulheres indígenas
Na ocasião da eleição para o próximo triênio 2023-2026, a assembleia votou em Marcilene Guajajara, da Terra Indígena Caru, como coordenadora geral da Coapima. Maria Helena Gavião como vice-coordenadora geral, Ricardo Kanela como tesoureiro e Danilo Guajajara secretário. A coordenação segue em mais um mandato conduzido por mulheres e respeitando a estrutura de paridade entre os povos Jê e Tupi.
“Sou muito grata a cada liderança que saiu das suas bases para estar aqui dando o seu voto de confiança mais uma vez para mim, sei que não vai ser fácil, mas conto com a força e com a ajuda de vocês e da nova coordenação que está chegando”, proferiu a coordenadora Marcilene na sua fala como eleita.
Nova coordenação executiva da Coapima, da esquerda para a direita: Marcilena Guajajara (coordenadora geral), Maria Helena Gavião (vice-coordenadora geral), Ricardo Kanela (tesoureiro) e Danilo Guajajara (secretário).
O encerramento da assembleia foi marcado pela leitura do Documento Final da VI Assembleia Ordinária da Coapima, que traz posicionamentos de como a organização atuará nos próximos anos, reforçando lutas históricas como a demarcação de terras e a contribuição dos povos indígenas para a manutenção da democracia no país. Leia aqui alguns trechos do documento:
“Nós povos indígenas possuímos modelos de economia própria, não somos entraves ao desenvolvimento do país. Pelo contrário, lutamos pela valorização das nossas economias, nossos jeitos de produzir e utilizar nossos recursos naturais, pois temos convicção que são elas que trarão o real desenvolvimento do país: geração de renda sem destruir nossas terras e nossos biomas, a partir de uma relação que não se baseia na propriedade individual, mas dos nossos planos coletivos para o bem-viver de nossas comunidades”.