Segundo dados do PRODES Cerrado, a perda de vegetação nativa no bioma cresceu 25% em 2022, o maior índice dos últimos sete anos.
Indígenas, quilombolas, pescadores artesanais, fundos e fechos de pasto, quebradeiras de coco e diversos outros segmentos de povos e comunidades tradicionais alertam para as ameaças que circundam o Cerrado há anos. No entanto, o berço das águas do Brasil segue negligenciado por políticas que não consideram a importância política, social, econômica e cultural desse bioma. Segundo dados do projeto PRODES Cerrado, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), divulgados na última quarta-feira (13), o desmatamento na savana brasileira cresceu 25% em 2022, uma área de 10,6 mil km², o que equivale a cerca de uma cidade de Manaus.
Esse é o terceiro ano consecutivo de aumento da devastação do Cerrado e o maior dos últimos sete anos, com destaque para os estados do MATOPIBA, fronteira agrícola com grande produção de monocultivos e conflitos agrários. A região vem se tornando centro de perseguição e violência contra povos e comunidades tradicionais e agricultores familiares e apresenta o quadro mais acelerado de desmatamento no bioma. Para Isabel Figueiredo, coordenadora do Programa Cerrado e Caatinga do ISPN, os dados são assustadores e demonstram a negligência do estado em relação ao bioma
“Os dados refletem o que as comunidades têm denunciado e que ninguém ouve.”
O avanço da destruição no Cerrado aponta problemas graves para toda a sociedade. Responsável por contribuir com grande parte da vazão dos rios de oito das doze regiões hidrográficas do país, o bioma é considerado a savana mais biodiversa do mundo e é essencial para o abastecimento de água e energia no Brasil. Mas o risco de colapso hídrico é real se ele continuar a ser desmatado. É isso que mostra um estudo apoiado pelo ISPN e desenvolvido pelo geógrafo e pesquisador Yuri Salmona divulgado em novembro. De acordo com a pesquisa, os rios do Cerrado já diminuíram 15% de sua vazão e podem perder um terço de sua água até 2050, transformando rios perenes, os que correm durante todo ano, em rios intermitentes, aqueles cujos leitos secam durante um período do ano.
Prioridade:
Na semana anterior, a União Europeia aprovou uma nova normativa que proíbe as importações de produtos brasileiros frutos do desmatamento. No entanto, a medida considerou apenas a proteção de ecossistemas florestais. Para Isabel, mais uma vez o Cerrado foi subestimado em sua importância para o equilíbrio climático, ambiental e social do planeta.
A nova legislação da União Europeia pode aumentar a pressão sobre o Cerrado nos próximos dois anos. Quando só se protege um bioma [a Amazônia], se desloca o desmatamento para outros, como o Cerrado.”
A coordenadora alerta ainda para a seriedade que o novo governo eleito deve olhar para as demandas do bioma e de seus povos, principais responsáveis pelo que ainda existe do Cerrado em pé.
“Agora precisamos de ações concretas do governo federal. Lula precisa falar a palavra Cerrado em seus discursos, ouvir os povos do bioma e colocar na sua lista de prioridade, senão, estaremos sem água para beber, produzir e gerar energia muito antes do que se espera.”
Sobre o Cerrado
Conhecido como “berço das águas”, o Cerrado abriga nascentes de rios de 8 das 12 bacias hidrográficas mais importantes do país e o segundo maior reservatório subterrâneo de água do mundo, que são os aquíferos Guarani e Urucuia. Além disso, fornece 70% da água do Rio São Francisco, que abastece a região Nordeste brasileira, e 47% da água do Rio Paraná, que abastece a hidrelétrica de Itaipu. Suas águas são importantes também para Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai. Além de saciar a sede, suas águas são essenciais para a geração de energia elétrica no Brasil, cuja matriz energética é baseada nas hidroelétricas.
Confira o vídeo animação que relaciona o desmatamento do Cerrado à diminuição da água no Brasil.
Conheça:
Foto da matéria: Adriano Gambarini / WWF-Brazil