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Ato pela Terra reuniu cantos contra Pacote da Destruição

Manifestação aconteceu para barrar retrocessos socioambientais em curso no governo. Agenda Cultural fez coro às lutas de povos e comunidades tradicionais e organizações socioambientalistas. O ISPN levantou a bandeira do Cerrado para somar à causa. 

Na tarde de ontem, milhares de pessoas se reuniram em Brasília, na frente do Congresso Nacional, para cantar e dizer não ao Pacote da Destruição no “Ato pela Terra”. Puxado por Caetano Veloso, a manifestação contou com diversos artistas que somaram à luta de indígenas, quilombolas, agricultores familiares, pescadores artesanais, organizações e redes socioambientalistas que enxergam nas medidas antiambientais do governo prejuízos históricos para a economia, o meio ambiente e a vida da população. O ISPN esteve presente com mensagens sobre a importância de se considerar o Cerrado nas pautas socioambientais e ouvir as vozes dos povos e comunidades tradicionais nos movimentos que tentam barrar as ameaças em curso no parlamento.

Pelo menos seis Projetos de Lei (PLs) com impactos diretos e irreversíveis para os direitos humanos, o clima, a segurança dos povos e os biomas brasileiros aguardam votação no Congresso. Eles fazem parte do que é chamado de “combo da destruição”. As manifestações focaram nas medidas a seguir:

–  PL nº 2.159, que torna o licenciamento ambiental uma exceção, em vez de ser a regra;

–  PL nº 2.633 e o PL nº 510, que concedem anistia à grilagem em terras públicas;

– PL nº 490, que trata do chamado “marco temporal” das terras indígenas, que estabelece que povos indígenas só podem reivindicar as terras que eles ocupavam no momento em que a Constituição de 1988 foi aprovada;

– PL nº 191, que autoriza a mineração e a construção de hidrelétricas em terras indígenas, até mesmo naquelas em que há indígenas isolados;

–  PL nº 6.299, o chamado “Pacote do Veneno”, que revoga a atual Lei de Agrotóxicos (7.802/89) e flexibiliza ainda mais a aprovação e o uso de agrotóxicos no país.

Antes do ato cultural, às 15h, artistas estiveram em audiência pública no Senado. A conversa foi com o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). No momento, Caetano Veloso leu e entregou uma carta a Pacheco e cantou o refrão da música Terra, no Salão Negro do Congresso. “O Brasil vive hoje sua maior encruzilhada ambiental desde a democratização. O desmatamento saiu do controle. A violência contra indígenas e povos tradicionais e a nossa credibilidade internacional arrasada”, advertiu Caetano com fala veiculada em diferentes veículos de imprensa.

A principal reivindicação do ato foi a exigência de que os parlamentares, em especial Pacheco, garantam que nenhuma proposta seja colocada em votação até que esteja alinhada com o que diz a ciência, as demandas e necessidades das populações tradicionais e à luz da emergência climática vigente.

Quem olha pelo Cerrado?

Durante a programação cultural, o ISPN somou a luta pela proteção do Cerrado e seus povos aos cantos contra os retrocessos socioambientais. Historicamente invisibilizado nas agendas ambientais, o bioma, que já perdeu metade de sua vegetação nativa, é berço das águas, de rica diversidade cultural, de fauna e flora, além de ter um importante estoque de carbono, fundamental para o equilíbrio climático. Mesmo sendo essa potência, a savana mais biodiversa do mundo não figura nas grandes reivindicações ambientais no Brasil.

“Nós perguntamos: quem olha pelo Cerrado? Ele já perdeu 16,8 milhões de hectares para a soja e outras monoculturas nos últimos 36 anos. Esse bioma é importante não só para quem vive nele, mas para toda população brasileira e mundial. O equilíbrio dos outros biomas, inclusive da Amazônia, depende do que acontece no Cerrado. A água que nós bebemos vem do Cerrado, e é preciso entender que o Pacote da Destruição também ataca diretamente essa riqueza brasileira. Sem Cerrado não há água, não há vida”, comenta a ecóloga e coordenadora do Programa Cerrado e Caatinga do ISPN, Isabel Figueiredo.

Para levar essa mensagem em um ato marcante para a luta socioambiental do Brasil, a organização contou com uma performance, idealizada por um dos nomes mais importantes do teatro de Brasília, José Regino de Olieira, que é diretor, arte educador e palhaço. Estudantes indígenas levaram um tronco de árvore queimado, simbolizando a destruição do Cerrado, enquanto outro grupo de pessoas distribuía gotas de água para os manifestantes lembrando de onde vem a água que chega em nossas casas. Por fim, uma faixa fechava o cortejo com o recado “Ainda há tempo de cuidar do nosso bem mais preciso #CerradoVivo”.

Além da performance, o ISPN contou com uma balão que subiu aos céus já no final da tarde com duas faixas penduradas e os dizeres: “Quem olha pelo Cerrado?” e “#CerradoVivo”. O momento causou grande comoção dos presentes, que se encantaram com a magia do veículo. O céu de Brasília recebeu mensagens do bioma casa da manifestação, que já se tornou histórica para milhares de pessoas.

Câmara aprova urgência para projeto sobre mineração em terras indígenas

Enquanto havia luta em frente ao Congresso, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou a tramitação em regime de urgência de um dos PLs focos das reivindicações, o 191. A medida, que trata sobre a mineração e a construção de hidrelétricas em terras indígenas, significa um retrocesso sem tamanho para os povos originários e a própria noção de justiça e conservação ambiental do país.

“É um projeto de morte. Jamais vou me ajoelhar diante do homem que quer destruir meu território. Jamais vou me ajoelhar diante de pessoas que pensam que vão comprar a gente por causa de dinheiro. A gente não negocia nossos filhos, a gente não negocia nossa mãe terra, a gente não negocia nossa vida. Por isso nos ameaçam. Se não tiver um projeto de vida para nós, a gente nunca vai aceitar um projeto de morte para nosso território”, denuncia Alessandra Munduruku, primeira mulher a presidir a Associação Indígena Pariri, em entrevista ao Portal G1.

Ao anunciar a votação do requerimento nesta quarta-feira (9), o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou também que a proposta será analisada por um grupo de trabalho e só será incluída na pauta em abril.

Terra, por mais distante

O Ato pela pela Terra foi a potência de arte e luta necessária para que artistas consagrados, movimentos sociais, organizações da sociedade civil, povos e comunidades tradicionais, estudantes e toda gente que acredita em um planeta de justiça social e equilíbrio ambiental pudessem se fortalecer. Por mais distante que essa Terra pareça estar diante das ameaças que surgem, os cantos da sociedade nesse dia nove de março já ecoam dentro das dinâmicas políticas. A manifestação marcou uma história de luta. Quem jamais a esqueceria?

Confira mais fotos em nosso Instagram. Assista também a cobertura completa do ato transmitida ao vivo pela Mídia Ninja:

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