Foto: Acervo ISPN/Thomas Bauer

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Alerta: Cerrado em risco

De acordo com o Mapbiomas Alerta, o Cerrado é o bioma com a segunda maior velocidade de desmatamento do Brasil, atrás apenas do Pantanal, que excepcionalmente em 2020 enfrentou tragédia sem precedentes por incêndios

De acordo com o MapBiomas Alerta divulgado em junho de 2021, foram validados 186.616 casos de desmatamento no Brasil em 2020, o que representa uma média diária de 203 novos eventos de supressão vegetal nativa, comparado ao ano anterior. Apesar da preocupação pública recair com mais intensidade sobre a Amazônia, os números mostram um outro bioma ainda mais em risco: o Cerrado. Do total de desmatamento, 31,2% da área devastada no país correspondem à região de Cerrado.

Os indicadores de velocidade de desmatamento do bioma, que já eram os mais altos em 2019, quando comparados aos demais biomas e considerando critérios de velocidade média e velocidade máxima, cresceram em 2020. No ano, o Cerrado teve 10% de aumento de alertas e ocupa a posição de segunda maior velocidade de desmatamento do Brasil, atrás apenas do Pantanal que, excepcionalmente no ano passado, enfrentou tragédia sem precedentes. Só em 2020, o Cerrado perdeu 432.183 hectares de vegetação nativa.

 

Mato Grosso e Maranhão são os estados mais críticos

Dois dos três estados com mais alerta de desmatamento do país são estados de transição entre Cerrado e Amazônia: Mato Grosso e Maranhão, ambos atrás do estado do Pará, que lidera em desmatamentos em todo o Brasil. Na segunda posição, o Mato Grosso representa 12,86% dos desmatamentos; na terceira, o Maranhão, que dobrou a área desmatada quando comparado ao ano anterior e atualmente concentra 12,08% da área desmatada do país. O município de Balsas, localizado na região conhecida como Matopiba (fronteiras entre estados do MA, TO, PI e BA), é a cidade do Cerrado que registrou a área de maior desmatamento (5,9 mil hectares) e configura em 5º lugar no ranking de municípios que mais desmataram.

O relatório do Mapbiomas Alerta ainda indica que cerca de 75% do desmatamento do Cerrado foram realizados em áreas privadas. O bioma tem a maior variação de área desmatada (152%), com número máximo de área muito próximo ao da Amazônia. O antropólogo e Coordenador-executivo do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), Fabio Vaz, demonstra preocupação com os números.

“Apesar de a Amazônia concentrar mais alertas, o Cerrado tem mais chances de desaparecer rapidamente por completo, caso não seja tomada nenhuma atitude que mude as práticas de produção agropecuária na região”, comenta Vaz. “Por ter menor área que a Amazônia, mas uma velocidade maior de desmatamento, é claro que o que resta de vegetação nativa corre mais risco”, complementa.

 

Savanas também precisam de proteção

Mais de 70% do desmatamento no Cerrado são em áreas savânicas, tão importantes quanto as florestas para a manutenção do equilíbrio climático. Considerado a savana mais biodiversa do mundo, o Cerrado representa 5% da biodiversidade mundial de espécies de fauna e flora, muitas delas encontradas apenas na região. 30% da biodiversidade do Brasil está no Cerrado, que também é famoso por ser a caixa d’água do país, já que oito das doze bacias hidrográficas que abastecem a população nascem no bioma.

Foto: Acervo ISPN/André Dib
Lobo-guará, espécie nativa do Cerrado (Foto: Acervo ISPN/André Dib)

“O Cerrado é muitas vezes ignorado por consequência de uma narrativa antiga de que o bioma não é produtivo”, diz Fabio Vaz. “Essa narrativa equivocada favorece o desmatamento. É preciso que se entenda que o Cerrado é rico, diverso e povoado por comunidades tradicionais que o conservam e enfrentam ameaças externas de desmatamento em seus territórios”, destaca.

 

Comunidades tradicionais

A existência de comunidades tradicionais é algo ainda desconhecido da população e do governo. Segundo levantamento realizado em parte do Matopiba pelo ISPN e pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), em parceria com a Rede Cerrado, constatou-se que existem 3,5 vezes mais comunidades tradicionais do que mostram os dados oficiais. São indígenas, quilombolas, ribeirinhos, apanhadoras de flores sempre-vivas, fecheiros e outros dos mais de 20 segmentos tradicionais que têm cadeira do Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais do país.

Extremamente diverso em populações, o Cerrado é também o bioma que, proporcionalmente, tem mais alerta de desmatamento em territórios quilombolas do Brasil, oito deles estão no estado do Maranhão.

Foto: Acervo ISPN/Peter Caton
Quebradeiras de coco babaçu (Foto: Acervo ISPN/Peter Caton)

 

Promoção de Paisagens Produtivas Ecossociais

Se por trás dos números de desmatamento existe uma realidade frequente de avanço do agronegócio e da grilagem de terras, Fabio Vaz destaca que é possível produzir alimentos com conservação ambiental. O ISPN tem como principal estratégia de conservação a promoção de Paisagens Produtivas Ecossociais, que recupera áreas degradadas e conserva o que precisa ser conservado. Por meio de apoio aos povos, comunidades tradicionais e agricultores familiares, o Instituto estimula formas de produção que mantêm o Cerrado em pé.

De acordo com estudo divulgado recentemente pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), os povos indígenas e comunidades tradicionais são as pessoas que mais conservam o meio ambiente. A garantia de justiça climática no Brasil passa, portanto, necessariamente, pela proteção desses povos e de seus territórios, que conservam a biodiversidade do Cerrado e, consequentemente, garantem água, energia e alimentos para brasileiros. A atenção ao bioma é de interesse de todos.

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