Representantes de comunidades locais da América Latina, Caribe, África e Ásia, articuladas internacionalmente, chegaram ao palco de negociações climáticas internacionais, a COP30, em Belém, buscando reconhecimento político e espaço de participação efetiva na agenda climática da ONU.
Reunidos em um Fórum Global de Comunidades Locais sobre Mudança Climática, os participantes clamam pelo reconhecimento do recém-criado Caucus de Comunidades Locais na Convenção do Clima da ONU, o que significará um avanço na representação qualificada dessas comunidades nas negociações e espaços de discussão em âmbito global.
“É um esforço para a Convenção perceber que as comunidades amadureceram sua organização e, a partir de agora, desejamos que este coletivo possa ser acionado para participação mais direta”, afirma o presidente da Rede Mexicana de Organizações Campesinas e Florestais (Red Mocaf) e representante da coordenação do Fórum pela região América Latina e Caribe, Gustavo Sánchez.
Uma das maneiras de ampliar essa participação das comunidades é melhorar a sua interação com a Plataforma de Comunidades Locais e Povos Indígenas (LCIPP) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC). Instituída em 2015 pelo Acordo de Paris, a LCIPP ganhou em 2018 um mecanismo de operacionalização das funções deste espaço, o Grupo de Trabalho Facilitador (FWG), que tem sete membros indígenas e sete membros dos governos.
A LCIPP tem como objetivos fortalecer a participação plena e efetiva de povos indígenas e comunidades locais na UNFCCC, promover o respeito e a integração ética de seus conhecimentos, construir capacidades, e fomentar ações climáticas baseadas em direitos, territórios e saberes tradicionais.
Na COP24, ocorrida na Polônia em 2018, ficou previsto que seriam adicionados três membros de comunidades locais à Plataforma, o que ainda não aconteceu.
“É inadiável que as Partes avancem na criação de vagas para as comunidades locais, conforme anunciado há anos. Não há justificativa moral, política ou técnica para o atual estado de exclusão. O tempo da promessa já passou. Agora é o tempo da coerência e da coragem institucional. Não podemos continuar debatendo soluções climáticas sem a presença direta de quem sente na pele a seca, o fogo e o desalento, mas também guarda o conhecimento que sustenta a vida”, destacou o líder geraizeiro, Samuel Caetano, do norte de Minas Gerais.
Participação na COP30

Na terça-feira (11/11), os representantes das Comunidades Locais apresentaram a mesa As Comunidades Locais e sua articulação global como sujeito de direitos na Zona Azul da Conferência do Clima. O objetivo do evento foi compartilhar os avanços na articulação global das comunidades locais, apresentar propostas para o futuro e fortalecer a construção do Caucus Internacional de Comunidades Locais, como um espaço político permanente, autônomo e plural.
“A organização do nosso fórum global amplia a representatividade das comunidades. Agora precisamos que as Partes da Convenção reconheçam esse esforço e facilitem este direito”, avalia Gabrielle Thum, do povo Pomerano do Rio Grande do Sul.
Nesse sentido, o grupo realizou uma reunião com o relator especial da ONU para os direitos de povos indígenas, Dr Albert K. Barume, para uma conversa estratégica sobre o reconhecimento pela UNFCCC do Caucus de Comunidades Locais.

Neste momento histórico, as comunidades locais estão unindo forças para se posicionarem como sujeitos de direitos diante das mudanças climáticas, reivindicando não apenas o reconhecimento de seus modos de vida e conhecimentos tradicionais, mas também seu papel ativo na construção das soluções globais para a crise climática.
“A força do novo Caucus depende de sua autonomia: somente um espaço auto definido e independente de governos pode legitimar as vozes de comunidades locais e garantir indicações representativas às vagas do FWG”, destaca Guilherme Eidt, coordenador de Advocacy e Políticas Públicas do ISPN. O Caucus nasce para assegurar que comunidades africanas, asiáticas e latino-americanas escolham diretamente seus próprios representantes — uma arquitetura de governança baseada em legitimidade territorial, e não em nomeações externas.
O Fórum Global elegeu uma coordenação política com a indicação das seis representações regionais — Nigéria, Camarões, Nepal, Indonésia, México e Brasil. “Qualquer indicação para o FWG só é legítima quando conduzida por um Caucus que se organiza de forma autônoma, refletindo a diversidade real e a autodeterminação das comunidades locais no processo climático global”, reforça Eidt.
Fazem parte do Fórum Global de Comunidades Locais sobre Mudança Climática organizações tais como: Rede de Mulheres Africanas para a Gestão Comunitária das Florestas (REFACOF), Federation of community Forestry Users Nepal (FECOFUN), Rede Cerrado, Utz Che, Red Mocaf, Green Foundation Nepal, Women Rights and Resource Network (WRRN), entre outras. O ISPN é parceiro e presta assessoria técnica para o Fórum, junto com outras organizações da sociedade civil.
Entenda mais
- Desde 2018, organizações comunitárias dessas regiões vêm articulando esforços para fortalecer o reconhecimento e a participação das comunidades locais no regime climático da UNFCCC.
- Mesmo desempenhando um papel essencial na conservação da biodiversidade e na regulação/adaptação climática, essas comunidades ainda não possuem representação formal nos espaços decisórios da Convenção.
- A invisibilidade institucional limita acesso a negociações, financiamentos e mecanismos de consulta — especialmente urgente para povos afrodescendentes e quilombolas, que enfrentam racismo ambiental e impactos desproporcionais das mudanças climáticas.
Demandas centrais do Caucus de Comunidades Locais
- Reconhecimento formal das comunidades locais como “constituency” da UNFCCC;
- Inclusão em órgãos como a LCIPP (Plataforma de Comunidades Locais e Povos Indígenas);
- Criação de um Fundo de Participação de Comunidades Locais;
- Mecanismos de consulta intercultural;
- Acesso direto a financiamento climático.