I Fórum Estadual Diálogos Indígenas foi precursor no tema do acesso e permanência de estudantes indígenas na Universidade Estadual do Maranhão (UEMA)
O ano de 2024 deixa a marca de um avanço histórico para a comunidade indígena nos diversos campi da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA). A partir das ações do Programa Indígena de Permanência e Oportunidades na Universidade (PIPOU), uma iniciativa do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), em parceria com a empresa Vale, os estudantes indígenas conseguiram dialogar diretamente com a administração da UEMA para apresentar suas demandas específicas.
O ápice desse movimento de aproximação, que contou com a participação ativa da gestão da universidade, ocorreu no auditório do Centro de Ciências Sociais Aplicadas, no campus de São Luís, nos últimos dias 5 e 6 de novembro, quando foi realizado o I Fórum Estadual Diálogos Indígenas na UEMA.
O Fórum Estadual foi a culminância do projeto Diálogos Indígenas na UEMA: Fortalecendo a Permanência Universitária, realizado pela Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Estudantis (PROEXAE) com apoio do PIPOU. Ao longo de 2024, quatro Fóruns Regionais foram realizados nos campi de São Luís, Barra do Corda, Grajaú e Santa Inês. Todas as etapas do projeto foram planejadas e executadas pela PROEXAE e por representantes dos estudantes indígenas, incluindo a elaboração da proposta e da programação dos fóruns.
Esses encontros prévios serviram como uma preparação, tanto dos estudantes, como da administração da UEMA, para o I Fórum Estadual, que reuniu 75 acadêmicos indígenas para discutir como superar diversos obstáculos para a permanência no ensino superior, como a criação de estratégias para fortalecer políticas públicas afirmativas e o enfrentamento do preconceito e do racismo. Durante o evento, os estudantes indígenas ficaram frente a frente com os pró-reitores e pró-reitoras da UEMA para tratar de diversas demandas.
O I Fórum Estadual Diálogos Indígenas da UEMA teve como resultado a formação de uma comissão de estudantes para a organização de um coletivo estudantil indígena, que ficará responsável pela comunicação com a gestão universitária. De toda a discussão, desde os fóruns regionais, resultou um documento com pautas e demandas dos estudantes, assim como alguns encaminhamentos apontados pela administração da universidade. O acadêmico de Engenharia da Computação do Instituto Federal do Maranhão (IFMA), Cristiano Caragiu Guajajara Júnior, que integra a equipe executiva do projeto Diálogos Indígenas na UEMA, destacou a importância desse momento para a comunidade acadêmica.
“Nós somos minoria. Quase não éramos escutados dentro da Universidade. Os estudantes indígenas eram deixados de fora de muitos programas, projetos e editais. Então, esse projeto facilitou o diálogo com a Universidade, com as pró-reitorias, para que a gente conseguisse alguns encaminhamentos. Estamos vivendo um momento histórico, porque a partir daqui, estamos dando origem a um movimento indígena dentro da UEMA, o que antes não existia. É um momento histórico para todos nós acadêmicos indígenas, especialmente na UEMA. Nós vamos buscar cada vez mais melhorias para que a Universidade se torne um ambiente acolhedor para os indígenas”, afirmou Cristiano Caragiu Guajajara Júnior.
Cristiano Guajajara é um exemplo de como inúmeras dificuldades afetam a permanência dos estudantes indígenas na universidade. Ele é ex-aluno da UEMA, também de Engenharia da Computação, mas optou por fazer o mesmo curso no IFMA, em Santa Inês, a mais de 200 quilômetros de São Luís, pela proximidade da Terra Indígena Rio Pindaré, onde tem família. O alto custo para manter os estudos longe dos seus territórios é um dos obstáculos enfrentados pelos estudantes indígenas, mas existem muitos outros.

Participando do debate, a estudante de Pedagogia da UEMA, Brenda Guajajara, ressaltou o quanto ela achava distante a possibilidade de cursar o ensino superior, mas ao ver que outros jovens do seu território conseguiram, sentiu-se fortalecida. “Claro que existem muitos desafios porque é um ambiente que a gente não tem convivência, é um ambiente totalmente diferente da nossa realidade, mas quando a gente tem o objetivo de sair do nosso território e entrar em uma universidade, a gente tem também o objetivo de retornar e poder contribuir, então isso que nos fortalece ainda mais”, afirma Brenda. A estudante também destacou que há pessoas, professores, dentro da comunidade acadêmica, que se dispõem a ajudar e que os acolhem e orientam, apesar dos relatos de preconceito sentido dentro da Universidade, nos seus diversos campi.
A oportunidade de discutir essas dificuldades diretamente com a gestão da universidade também foi um marco para outra estudante, Regiane dos Santos Guajajara, que faz Licenciatura Intercultural pelo Programa de Formação Docente para Diversidade Étnica da UEMA (PROETNOS). “A gente debateu a realidade e a dificuldade que a gente enfrenta dentro da Universidade. Algumas conquistas a gente vai colher rápido, mas outras, mais para frente”, comentou.

A Universidade Estadual do Maranhão está entre as instituições de ensino superior do Nordeste do Brasil com maior número de estudantes indígenas inscritos nos seus cursos de graduação, cerca de 300. A professora Ilka Serra, pró-reitora de Extensão e Assuntos Estudantis, ressaltou o interesse da universidade em fortalecer a comunidade indígena nos diversos campi e de seguir com a realização de um Fórum Estadual dos Estudantes Indígenas a cada ano.
“A parceria com o ISPN foi muito importante. Nós tínhamos contato na perspectiva do PIPOU, que é esse programa de permanência Indígena; e em diálogos também com os próprios alunos indígenas, surgiu a necessidade de expandirmos esse trabalho. E foi nesse contexto que apresentamos proposta para o ISPN para que esse projeto pudesse ser estendido a outros campi da universidade e ser estendido também para outros fóruns, além de regional, o próprio fórum estadual. O que nós queremos muito é fortalecer essa parceria, de modo que todos os anos tenhamos esse fórum estadual e numa perspectiva muito mais ampla de políticas que realmente atendam a permanência e a qualificação desses alunos indígenas”, afirmou Ilka Serra.
O PIPOU é um programa que apoia a permanência de estudantes indígenas na graduação por meio da concessão de bolsa de estudos, a doação de notebook e a promoção de atividades formativas. O programa busca também fortalecer ações afirmativas para indígenas nas instituições de ensino superior ao estabelecer parcerias com universidades para que desenvolvam projetos como este realizado pela UEMA.
O assessor técnico do PIPOU, Francisco Sarmento, do povo Tukano, conhece as necessidades mais urgentes e comuns enfrentadas pelos estudantes indígenas nas diversas instituições de ensino superior e enfatizou algumas das demandas discutidas pelos estudantes indígenas nos fóruns. “Primeiro, o acesso específico, um vestibular específico para a população indígena. Tem também o enfrentamento do preconceito não só físico, mas institucional, ou seja, o preconceito de parte das próprias estruturas das universidades. E existe a necessidade de espaços, tanto de espaços de estudo, laboratórios e salas de informática, como espaços de encontros e discussão, um centro cultural e de convivência, por exemplo, e de alojamentos dentro da universidade. Além disso, foi colocado em todos os fóruns a necessidade de criar um coletivo estudantil articulado dentro da universidade”.
O PIPOU conta com 140 bolsistas, estudantes que representam 47 povos indígenas, em 55 cursos de graduação, distribuídos em 27 instituições de ensino superior. Entre os bolsistas, 17 estão na UEMA e cinco receberam apoio do programa e concluíram seus cursos nesta universidade.
Um deles é Weldeson Coelho Guajajara, da Terra Indígena Rio Pindaré, formado em Ciências Sociais em 2023. “Participei do PIPOU como bolsista e membro do colegiado. O PIPOU é um programa de apoio aos universitários, tanto acompanhamento acadêmico, quanto apoio financeiro, equipamento, e além de acompanhamento pedagógico. É um programa que tem ajudado bastante os acadêmicos, estudantes indígenas, e que tem ajudado a permanência destes na universidade”, comentou. Weldeson Guajajara participou do I Fórum Estadual Acadêmico Indígena.
A diretora-superintendente do ISPN, Cristiane Azevedo, foi a São Luís acompanhar os dois dias do Fórum. Na cerimônia de abertura, ela parabenizou os estudantes indígenas e os pró-reitores e pró-reitoras da Universidade pela disposição para o diálogo e pediu continuidade. “É importante trabalharmos por uma política pública de permanência dos estudantes indígenas, como a que já existe para o ingresso ao ensino superior. É muito bom ver esse diálogo sobre a permanência universitária. Eu vejo que a Universidade ganha muito, porque é uma potência para o conhecimento essa coexistência de saberes acadêmicos com saberes ancestrais. Isso é muito importante para construirmos uma sociedade mais justa, com mais equidade. A Academia tem essa função também, de fazer a gente pensar, refletir e agregar outros saberes”, afirmou a diretora-superintendente do ISPN, Cristiane Azevedo.
Além da diretora-superintendente do ISPN, a mesa de abertura contou com a presença do vice-reitor da UEMA, Paulo Catunda; da pró-reitora de Extensão e Assuntos Estudantis, Ilka Serra; do pró-reitor adjunto da Pró-Reitoria de Graduação, Cláudio Eduardo; do pró-reitor adjunto da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (Ppg), Fábio Figueiredo, da coordenadora de atividades extracurriculares, Poliana Cardoso; e do representante dos estudantes indígenas, Cristiano Caragiu Guajajara Júnior. A secretária-adjunta dos Direitos dos Povos Indígenas da Secretaria de Estado dos Direitos Humanos e Participação Popular do Maranhão, Rosilene Guajajara; e o reitor da UEMA, professor Walter Canales, também marcaram presença no I Fórum Estadual Acadêmico Indígena da UEMA.
